Armas de fogo: o que muda com a nova legislação

Armas de fogo: o que muda com a nova legislação

No dia 15 de janeiro deste ano (2019), o presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto que flexibiliza a posse de armas de fogo no Brasil. De acordo com a nota publicada pela Agência Brasil, um dos pontos desta flexibilização abrange a “presunção da verdade” sobre a necessidade de se ter em casa uma arma de fogo, sob a simples alegação.

Além disso, o cidadão também pode alegar que vive e mora em uma área perigosa ou violenta; ser um profissional de segurança ou mesmo morar em área rural. Para entender todos os trâmites do novo decreto, o blog Acontece LFG conversou com Rafael Dantas, professor da Rede LFG em Direito Penal e delegado da Polícia Federal em São Paulo. Confira.

Blog Acontece: O decreto assinado no início do ano pelo presidente Jair Bolsonaro flexibiliza a posse de arma. Primeiramente, gostaria que o professor nos explicasse em que isso poderia impactar no cenário criminal do país, bem como quais são as facilidades para poder ter a arma em casa.

Rafael Dantas: Sobre o decreto, a intenção do governo foi dar mais segurança jurídica para a obtenção da autorização para a posse de armas de fogo de calibre permitido. Anteriormente havia subjetividade, na visão do atual governo, quanto ao requisito da “efetiva necessidade” relativa à posse de uma arma de fogo.

BA: O que vem a ser “efetiva necessidade”?

RD: Trata-se de um termo muito aberto. O novo decreto esclarece que efetiva necessidade abrange: integrantes da administração penitenciária e do sistema socioeducativo, envolvidos em atividades de polícia administrativa, residentes de áreas rurais, residentes de áreas urbanas com elevado índice de homicídios, titulares ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais e industriais, colecionadores, atiradores e caçadores registrados no comando do Exército. Militares, ativos e inativos, e integrantes de carreira da Agência Brasileira de Inteligência.

BA: O Sr. acredita na possibilidade de pessoas andarem armadas na rua, mesmo que o decreto autorize somente a posse e não o porte de armas?

RD: O decreto abrange situações relativas à posse de arma de fogo, ou seja, a pessoa tem o direito de ter a arma na sua residência ou no local de trabalho do qual seja responsável. Isso não autoriza a pessoa transitar portando a arma por vias públicas.

Ainda quanto a isso, cabe lembrar do Referendo ocorrido em 2005, cuja pergunta feita ao povo foi: “O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?” Sendo que 63,94% dos votantes disse “não”, ou seja, o comércio de armas de fogo não foi proibido no Brasil, isso, segundo a soberania popular, lembrando o que diz o Art. 1º, Parágrafo único, da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”

Sendo assim, de que adianta garantir, por meio de referendo popular, a possibilidade de alguém adquirir uma arma de fogo, se esse direito é esvaziado por decretos que, de fato, inviabilizam tanto a posse e o porte de arma de fogo? Ou o poder emana do povo ou de especialistas em segurança pública, juristas ou sociólogos. Ou respeita-se a democracia (poder do povo), ou que se reconheça a plutocracia (poder de uma elite “intelectual”).

De toda forma, decerto que há inerente risco envolto com a posse e o porte de arma de fogo por pessoas, mas trata-se de um risco admitido como permitido pelo povo do Brasil.

BA: As taxas de feminicídio no país são altas. Além disso, temos também taxas relativamente grandes de suicídios, bem como de acidentes causados por armas de fogo. O que a facilidade de ter uma arma (ou mais de uma) em casa pode afetar ainda mais esses dados?

RD: Trata-se do risco inerente envolto com a posse e porte de armas de fogo, risco similar à questão dos veículos automotores. Observe-se o índice de letalidade referente a motociclistas em grandes cidades, é altíssimo, mas não se infere sobre proibir a posse e a emissão de CNHs referentes a motociclistas. Quanto ao feminicídio, há outra variável. Se o homem sabe que a mulher está armada, provavelmente não partirá para violência física contra ela. Ademais, a grande maioria dos crimes dessa espécie acontece por meio de armas ilegais, algo que está fora do âmbito de abrangência do novo decreto regulamentador. Por fim, quanto aos acidentes com armas de fogo, tanto para a posse, quanto para o porte, exige-se prova de aptidão técnica, que envolve tanto atirar com a arma, como também seu seguro manejo.

BA: O decreto libera somente a posse de armas e não o porte. Entretanto, há possibilidade de pessoas andarem armadas, alegando proteção?

RD: O decreto tornou mais claras e objetivas as hipóteses que autorizam a posse de arma, nada diz sobre o porte. Percebe-se como necessário, que também se esclareça de maneira mais objetiva o que é a efetiva necessidade para o porte de arma.

Ressalte-se, não se quer autorizar a posse e o porte de arma de fogo a qualquer pessoa. A arma de fogo é um objeto vulnerante e é necessário critério para tais autorizações, que não podem nem “liberar geral” e nem inviabilizar por completo. Critérios proporcionais, razoáveis, claros e objetivos têm o condão de dar maior segurança nesse tocante.

BA: O Sr. acredita que uma campanha de conscientização poderia resolver pequenas dúvidas da população no que diz respeito à posse de arma de fogo?

RD: Sim, trata-se de um direito à cidadania das pessoas, saber, de maneira clara, o que elas podem e não podem fazer. A politização do tema termina por atrapalhar o direito do cidadão.

BA: Por favor, explique quais critérios serão aplicados para quem deseja ter armas.

RD: Os requisitos para a posse de arma, de acordo com o novo decreto, são:

(a) ter idade mínima de 25 anos, exceto para os cargos definidos no artigo 28 da Lei 10.826/03;

(b) 1 (uma) foto 3×4 recente;

(c) original e cópia do RG e CPF;

(d) comprovante de residência (água, luz, telefone). Caso o imóvel esteja em nome do cônjuge ou companheiro (a), apresentar Certidão de Casamento ou de Comunhão Estável. Se o interessado não for o titular do comprovante de residência, nem seu cônjuge ou companheiro(a), deverá apresentar DECLARAÇÃO com firma reconhecida do titular da conta ou do proprietário do imóvel, sendo que a assinatura presencial do titular do comprovante de residência dispensará o reconhecimento de firma;

(e) apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita;

(f) declaração escrita da efetiva necessidade, expondo fatos e circunstâncias que justifiquem o pedido;

(g) declaração de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal;

(h) comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual (incluindo Juizados Especiais Criminais), Militar e Eleitoral, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos;

(i) comprovante bancário de pagamento da taxa devida para a emissão do documento através da Guia de Recolhimento da União – GRU;

(j) comprovação de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, realizado em prazo não superior a 01 ano, que deverá ser atestado por psicólogo credenciado pela Polícia Federal;

(k) comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo, realizado em prazo não superior a 01 ano, que deverá ser atestado por instrutor de armamento e tiro credenciado pela Polícia Federal; e

(l) declaração MANUSCRITA no sentido de que a residência é ou não habitada por criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, sendo que em caso afirmativo deverá ser declarado expressamente se a mesma possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento de arma de fogo.

Já os requisitos para o porte de arma de fogo, são:

(a) ter idade mínima de 25 anos;

(b) cópias autenticadas ou original e cópia do RG, CPF e comprovante de residência (água, luz, telefone). Caso o imóvel esteja em nome do cônjuge ou companheiro (a), apresentar Certidão de Casamento ou de Comunhão Estável. Se o interessado não for o titular do comprovante de residência, nem seu cônjuge ou companheiro(a), deverá apresentar DECLARAÇÃO com firma reconhecida do titular da conta ou do proprietário do imóvel, sendo que a assinatura presencial do titular do comprovante de residência dispensará o reconhecimento de firma;

(c) declaração escrita da efetiva necessidade, expondo fatos e circunstâncias que justifiquem o pedido, principalmente no tocante ao exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física;

(d) comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual (incluindo Juizados Especiais Criminais), Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos;

(e) apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita;

(f) comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, realizado em prazo não superior a 01 ano, que deverá ser atestado por instrutor de armamento e tiro e psicólogo credenciado pela Polícia Federal;

(g) cópia do certificado de registro de arma de fogo;

(h) 1 (uma) foto 3×4 recente.

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